Notícias

CONGRESSO INTERDISCIPLINAR


Atuação da Defensoria Pública na defesa dos vulneráveis é tema de evento nacional em Cuiabá

Encontro promovido pela DPEMT, por meio da Escola Superior, debateu importância da atuação multidisciplinar no combate às desigualdades sociais

Por Alexandre Guimarães
26 de de 2025 - 12:07
Bárbara Argôlo/DPEMT Atuação da Defensoria Pública na defesa dos vulneráveis é tema de evento nacional em Cuiabá


A defesa das pessoas em situação de vulnerabilidade em todo o país marcou os debates na última quinta-feira (25), no segundo dia do VI Congresso Brasileiro de Atuação Interdisciplinar nas Defensorias Públicas, na Fatec Senai, em Cuiabá.

Promovido pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT), por meio da Escola Superior da DPEMT (Esdep-MT), de 24 a 26 de setembro, o evento reúne profissionais de diversas áreas e estados para debater a interseccionalidade nas práticas de cuidado no âmbito judicial, extrajudicial e interdisciplinar das Defensorias Públicas de todo o Brasil.

Com o tema “Justiça e Cuidado: Desigualdades de Gênero, Raça e Classe na Garantia de Direitos”, a quarta conferência do congresso contou com a participação de Creuza Maria de Oliveira, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), além das defensoras públicas Michele Cândido Camelo (CE) e Patrícia Fonseca Carlos Magno de Oliveira (RJ).

“Comecei a trabalhar aos 10 anos de idade. Hoje, com 67, já estou aposentada por trabalho doméstico, mas não me aposentei da luta. A minha militância era silenciosa, chamando outras. Precisamos formar novas lideranças”, revelou Creuza, a primeira trabalhadora doméstica a receber o título “doutora honoris causa” do Brasil – concedido pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).

A baiana foi uma das maiores defensoras da proposta de emenda à Constituição – PEC das Domésticas, aprovada em 2013 pelo Congresso Nacional, que garantiu os direitos das trabalhadoras domésticas, reduzindo as desigualdades em relação a outras categorias.

De acordo com Patrícia de Oliveira, defensora pública do Rio de Janeiro, que começou a carreira como estagiária no órgão, a atuação jurídica não é nada sozinha, enquanto o trabalho intersetorial, junto com psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais, é essencial para promover direitos essenciais da população mais vulnerável.

“A Defensoria Pública precisa incidir no monitoramento da tutela coletiva, atuando como megafone das pessoas vulneráveis. Para uns, só chega o direito penal e para outros o constitucional, o direito de exercer direitos”, afirmou.

Para Michele Camelo, defensora pública do Ceará, historicamente existe uma divisão sexual do trabalho, sendo que o papel da mulher foi destinado ao cuidado dos filhos, da casa, dos idosos, e de toda a família.

“Somos criadas para o cuidado. Esse dever de cuidar é estimulado por todos. Tem uma exigência de perfeição, que é banalizada pelo Sistema de Justiça”, destacou.

A defensora citou um caso em que um pai torturou e matou o filho, mas foi a mãe quem teve a pena aumentada pela Justiça, acusada de negligência.

“Toleramos, naturalizamos a desigualdade de gênero. A sociedade exige que as mulheres trabalhem como se não tivessem filhos e que criem filhos como se não trabalhassem”, enfatizou.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mulheres tem duas vezes mais chances de desenvolver depressão do que homens.

Michele afirmou que na área cível, especialmente no “direito da família”, como casos de divórcio, pensão alimentícia, entre outros, quase 90% das pessoas que procuram a Defensoria Pública cearense são mulheres, 75% são pretas ou pardas, 70% são mães solteiras (solo), e 62% já perderam o emprego por falta de vaga em creche.

“Há dez anos, criamos no Ceará o orçamento participativo, para escutar a população. É muito difícil ser mulher, negra, ou ter um filho com alguma deficiência, e ter 15 pessoas na sua frente. Elas precisam de um atendimento preferencial. Criamos cinco núcleos de combate à violência contra a mulher no estado. Muitas vezes, o que as pessoas querem é um olhar diferente e nem sempre precisa de muitos recursos para colocar em prática”, relatou.

Nas apresentações, com duração aproximada de 20 minutos cada, as palestrantes concordaram que o acesso à Justiça não é neutro e cruza com marcas profundas das desigualdades sociais da sociedade brasileira. A mediação dos debates foi feita pela coordenadora do Centro Integrado de Apoio à Pessoa com Deficiência da Defensoria do Maranhão. 

No fim, todas agradeceram pelo convite feito pela Escola Superior da DPEMT (Esdep-MT) para participar do encontro nacional.

Depois das apresentações, por volta das 18h, ocorreu a apresentação da Rota da Ancestralidade em Cuiabá, projeto cultural que tem como objetivo resgatar e valorizar a história e a memória da população afro-brasileira e indígena, especialmente no centro histórico da capital mato-grossense.

Grupo de trabalhos – Após o intervalo do almoço, às 14h, ocorreu a apresentação de resumos aprovados sobre temas diversos, como o uso da Inteligência Artificial (AI) na Defensoria, o programa de proteção às pessoas ameaçadas de morte em Mato Grosso, a retificação de nome e marcador de sexo de pessoas trans em documentos, e a Lei  12.197/2023, conhecida como Lei da Pesca, que proibiu a pesca, o transporte e a comercialização de 12 espécies de peixes por cinco anos no estado, impactando a vida das comunidades ribeirinhas.

No intervalo entre a apresentação dos trabalhos e as palestras, por volta das 16h, o artista plástico Adriano Figueiredo finalizou uma pintura, ao vivo, com a temática do encontro.

Com o tema “Cuidado e Direitos Fundamentais”, o congresso segue nesta sexta-feira (26) com uma apresentação teatral, versão pocket, às 8h, e duas sessões de grupos de trabalhos, às 11h e 14h, com a apresentação de resumos aprovados.

O encerramento do evento está previsto para ocorrer às 16h, no auditório da Faculdade de Tecnologia Senai Mato Grosso (Fatec Senai).