Imagine ser condenado por um crime que você não cometeu e ter que utilizar tornozeleira eletrônica por quase um ano, mesmo sendo inocente? Foi o que aconteceu com Everton Cordeiro Alves, 34 anos.
Em 2019, ele foi condenado a 5 anos e 7 meses de reclusão, em primeira instância, pelo suposto crime de roubo com violência ou ameaça exercida com arma de fogo.
Segundo os autos, ele e mais três comparsas teriam roubado joias, celulares e dinheiro de três vítimas, em 2012, em uma avenida no centro de Rondonópolis (216 km de Cuiabá).
Porém, foi verificado posteriormente que ele não estava no local na hora do crime e que o verdadeiro autor utilizou uma identidade falsa com seus dados.
Everton não chegou a ficar preso, mas teve que utilizar tornozeleira eletrônica por quase um ano e enfrentou problemas por ter antecedentes criminais, mesmo sendo inocente.
A atuação da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) no caso teve início em 2023, com a propositura da revisão criminal perante o Tribunal de Justiça (TJMT), seguida de diversos recursos interpostos junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Finalmente, em abril de 2024, o STJ cancelou a condenação de Everton, concedeu a ordem de habeas corpus (HC) e determinou a remoção dos registros da condenação pelo Juízo das Execuções Penais.
Esse e muitos outros casos semelhantes motivaram o lançamento da campanha “Sem defesa, não há justiça”, em junho deste ano.
A iniciativa da DPEMT busca conscientizar a sociedade sobre a importância do direito de defesa e o papel essencial do órgão no Sistema de Justiça.

Dosimetria da pena – Um dos pontos principais de um julgamento na esfera criminal é a chamada dosimetria da pena, o cálculo que define o tempo de pena a ser cumprido pelo condenado, conforme o artigo 68 do Código Penal.
Para determinar a pena exata de um condenado, o juiz leva em conta as leis e as particularidades do crime e do réu.
É como uma receita com três etapas: primeiro é definida a pena-base, depois são avaliadas as atenuantes e agravantes (condições que diminuem ou aumentam a pena) e, por último, são consideradas as causas especiais de aumento ou diminuição da pena, com o intuito de que a pena seja proporcional ao crime e justa para cada caso.
De acordo com o defensor público Caio Cezar Buin Zumioti, a DPEMT acompanha cada processo de perto, garantindo que o juiz observe a lei e respeite os direitos das pessoas acusadas de cometer crimes.
“Isso inclui pedir a aplicação de atenuantes, contestar agravantes indevidas e defender causas de diminuição. O objetivo é garantir que a pena seja justa, proporcional e respeite os direitos fundamentais do acusado”, destacou.
Para entender melhor o assunto, entrevistamos Zumioti, defensor público que atua na coordenação do Núcleo Criminal de Cuiabá.

O que é e qual é a importância da dosimetria da pena para o Direito Penal no Brasil?
Caio Zumioti – A dosimetria é o procedimento em que o juiz fixa a pena do acusado, levando em consideração as circunstâncias do caso. Ela é fundamental porque garante que a punição seja proporcional à gravidade do crime e às condições pessoais do réu, evitando excessos ou injustiças.
Como é feito o cálculo da pena do réu, considerando os fatores atenuantes e agravantes?
C.Z. – O Código Penal estabelece três fases: Na primeira, o juiz define a pena-base, considerando fatores como antecedentes, personalidade e circunstâncias do crime.
Na segunda, aplica as atenuantes (como confissão espontânea ou ser menor de 21 anos na época do fato) e as agravantes (como reincidência ou prática contra pessoa idosa).
Por fim, analisa causas específicas que podem aumentar ou diminuir ainda mais a pena. Assim, a pena é ajustada para refletir melhor a situação concreta de cada acusado.
Quais são outras causas para aumento ou diminuição da pena?
C.Z. – Além das atenuantes e agravantes, existem causas especiais previstas em lei que podem aumentar ou diminuir a pena. Por exemplo, são causas de aumento: crime cometido durante calamidade pública ou com emprego de violência grave.
Diminuição: tentativa de crime (quando a ação não chega ao resultado), arrependimento eficaz ou colaboração do réu com a Justiça.
Esses fatores permitem que a pena seja moldada de acordo com a realidade do caso.
Como a Defensoria Pública atua para que a pena fixada pelo juiz seja justa para cada caso?
C.Z. – A Defensoria acompanha cada processo de perto, garantindo que o juiz observe a lei e respeite os direitos fundamentais.
Isso inclui pedir a aplicação de atenuantes, contestar agravantes indevidas e defender causas de diminuição.
O objetivo é garantir que a pena seja justa, proporcional e respeite os direitos fundamentais do acusado.
A dosimetria da pena proporcional à conduta do acusado pode contribuir para a prevenção de crimes?
C.Z. – Sim. Quando a pena é equilibrada e respeita os limites legais, a sociedade percebe que a Justiça atua com racionalidade e imparcialidade.
Isso fortalece a confiança nas instituições e contribui para a reintegração social, evitando que punições desmedidas gerem novas situações de injustiça ou reincidência.