O Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatou pedido da Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) e anulou a audiência de justificação de A. de S., 37 anos, em que o juiz determinou a regressão do regime de pena do semiaberto para o fechado.
De acordo com os autos, como não foi regularmente intimada, a Defensoria Pública não pôde participar da audiência, que, mesmo assim, foi realizada com a nomeação de um advogado dativo e resultou na regressão.
“Essa decisão do STJ é muitíssimo importante, na medida em que reafirma, de modo contundente, sobretudo ao Poder Judiciário de Mato Grosso, o real alcance da prerrogativa de intimação pessoal da Defensoria Pública, que não se trata de um mero privilégio institucional, mas de um instrumento indispensável para assegurar que o defensor público, na tutela jurídica dos mais vulneráveis, tenha ciência efetiva dos atos processuais e possa atuar com a diligência, presteza e propriedade necessárias”, ressaltou o defensor público Cid de Campos Borges Filho, que atuou no caso.
Inicialmente, o morador de Primavera do Leste (234 km de Cuiabá) foi condenado a um ano e quatro meses de prisão, no regime semiaberto, pelo suposto crime de furto, em dezembro de 2019.
Porém, o Juízo da 4ª Vara Criminal de Rondonópolis decretou a regressão de regime para o fechado, no dia 6 de setembro de 2023, pela suposta prática de furto qualificado durante o cumprimento da pena.
No entanto, os autos da decisão foram encaminhados à Defensoria Pública somente às 20h06 da noite anterior, por meio de aplicativo de mensagens.
Imediatamente, a Defensoria manifestou-se pela necessidade de respeito ao prazo legal para a devida análise dos autos, garantindo a ampla defesa e o contraditório, e informou que não poderia participar da audiência para fazer a defesa, solicitando o reagendamento, com a devida intimação da nova data. Porém, o juiz manteve a audiência e nomeou um advogado dativo.
Diante disso, o pedido de habeas corpus (HC) foi impetrado pelo defensor público Cid de Campos Borges Filho em maio do ano passado, sustentando que não foi observada a garantia do acusado de ser defendido por um profissional da sua confiança.
“(…) o juízo de primeiro grau, em desrespeito à prerrogativa de intimação pessoal com vista dos autos, determinou que a intimação Defensoria Pública se aperfeiçoasse por WhatsApp. Ao assim proceder, é inconteste que (…) violou prerrogativas da Defensoria Pública: a intimação deveria haver ocorrido pelo sistema de processo eletrônico, de forma a possibilitar a análise dos autos e o controle dos prazos processuais”, diz trecho do HC.
Conforme a decisão do ministro Og Fernandes, de 29 de abril deste ano, o Juízo da execução penal violou os princípios do contraditório e da ampla defesa.
“No caso, é incontroverso que a intimação da Defensoria Pública para participar da audiência de justificação da qual resultou a decisão ora impugnada violou a prerrogativa prevista no art. 128, I, da Lei Complementar n. 80/1994”, diz trecho da decisão.
Anteriormente, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) havia negado provimento ao recurso (agravo em execução penal) contra a decisão que determinou a regressão do regime.
Fernandes destacou que a jurisprudência do STJ tem reforçado a presunção absoluta de prejuízo para a defesa no caso de não intimação ou intimação irregular da Defensoria Pública.
“(…) a intimação do defensor público ou dativo deve ser pessoal, sob pena de nulidade absoluta por cerceamento de defesa. A falta dessa intimação enseja a realização de novo julgamento (precedentes)”, afirma outro trecho da decisão.
O relator do caso citou ainda que é irrelevante a informação do Juízo de primeira instância sobre a participação de um defensor público em outras audiências realizadas no mesmo dia, para as quais também não tinha sido regularmente intimado.
“Negar essa prerrogativa é, na prática, fragilizar o acesso à Justiça daqueles que mais dela necessitam, comprometendo a equidade no Sistema Judiciário e violando o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e do devido processo legal, com as garantias da ampla defesa e do contraditório processual”, afirmou o defensor.
Desse modo, o ministro concedeu a ordem de ofício para declarar a nulidade da audiência de justificação e, por consequência, anular a decisão que determinou a regressão do regime de cumprimento da pena.
Assim, uma nova audiência deve ser agendada, com a intimação adequada da Defensoria Pública.